Retrospectiva 2021
Fim de 2021. Um ano que parece que durou dois. Difícil lembrar o que foi 2021 e o que foi 2020: tudo se juntou numa longa travessia. Estávamos no olho da pandemia. Foi muito ameaçador. Se hoje podemos sentar e escrever, é porque nos sentimos mais protegidos.
Tudo indica que não acabou. Agora, ao menos, temos a proteção das vacinas.
A palavra continua sendo esperança. Estamos até curtindo uns reencontros aqui e ali. Mas a cautela aumenta à medida que novos casos deixam claro que teremos de lidar com uma nova variante. Bem nessa época… quando achávamos que ia dar para festejar sem preocupação…
Nesses dois anos, aprendemos muita coisa. Descobrimos forças onde não conhecíamos. Aprendemos a valorizar o ar livre. Valorizar os abraços.
Quando criamos este blog, a vontade era de que ele fosse um diário de bordo. Relatos em um diário para a TRILHA do futuro conhecer a sua história. Num clima: vem cá, deixa eu contar o que passamos.
Dividir histórias ajuda a entender o que aconteceu.
Mas nunca imaginávamos que íamos contar que uma pandemia tomou o mundo. Foi um imenso turbilhão. Não dá para escrever diário navegando no meio de um redemoinho. Só agora conseguimos parar e tentar visualizar o que passamos.
Tanta coisa mudou para nós.
Tivemos que fechar o Taproom, nosso lugar favorito, de contato direto com nossos clientes, amigos, vizinhos. Onde sempre abastecíamos os ânimos nos momentos difíceis. Nada dá mais gás pra nós do que trocar impressões com nossos clientes ao pé das nossas torneiras de chope.
Ao mesmo tempo, a loja on-line passou a entregar para o Brasil inteiro. Descobrimos que a sede por nossas cervejas era maior do que imaginávamos. Difícil descrever essa sensação de ver as fronteiras se alargarem num momento em que estávamos trancados dentro de casa.
Foram tempos de sensações ambíguas.
Nunca ficamos tão sozinhos, cada um em sua casa, sem poder brindar e trocar ideia. Mas nunca nos aproximamos tanto dos outros. Todo mundo passou um pouco por isso. Entender que mesmo no isolamento, havia uma rede. Nesses dois anos, descobrimos que a TRILHA tem uma rede.
Ficamos mais próximos de produtores movidos pela mesma paixão que nós. Gente que não se conforma e sempre quer melhorar. Lançamos Grão, uma coffee IPA com os amigos da UM Coffee. Cacaueiro Baianí, uma pastry stout com cacau da fazenda da Baianí. Cuveé Trilha & Vivente, meio cerveja, meio vinho, com nossos amigos da Vivente Vinhos – parcerias que vão render muito.
Mas não foram só cervejas com ingredientes de parceiros. Foram trocas. Longas conversas, algumas das quais você pode acompanhar aqui. Conversas que nos ajudaram a relembrar porque estamos aqui, fazendo essas cervejas, remando contra a maré.
Essas trocas foram mostrando pra gente que além de não estar nessa sozinhos, nosso papel no mundo tinha de incluir criar e cuidar dessa rede.
Mesmo sendo pequenos, pudemos apoiar parceiros próximos que estavam em mares mais turbulentos. Vimos parceiros incríveis sofrerem muito – restaurantes e casas de show – e ficou claro para nós que todo mundo está exposto a um risco inimaginável. Ficamos felizes de poder ter estendido a mão para alguns desses parceiros nos momentos difíceis e, agora, ver a retomada tão esperada.
Ninguém anda sozinho.
Lá em março de 2020, quando tudo fechou, nossa primeira sensação foi medo. O que vai acontecer? Tivemos uma surpresa. As pessoas começaram a estocar nossas cervejas. Percebemos que a cerveja que produzimos com tanto cuidado, com tanta paixão, era importante para as pessoas passarem por esse momento difícil. Foi uma linda surpresa no meio do caos. De novo, aquele sentimento ambíguo: difícil falar em surpresa boa no meio de tanta notícia ruim.
Mas entendemos que podíamos fazer algo para melhorar o dia de cada pessoa que buscou conforto em nossas cervejas. Para quem estava chegando, criamos o Clube Descoberta, que apresenta estilos variados, amplia horizontes, ajuda a sair da rotina nesse período em que ela ficou sufocante. Para quem já se conectava profundamente com cerveja, nos dedicamos a aumentar os lançamentos de cervejas Barrel Aged. Saisons, Flanders, Stouts, Barley Wines. Tudo com aquela complexidade única que só o tempo traz.
O tempo traz descobertas e profundidade.
Nesse período cheio de desafios, descobrimos um pouco mais do nosso papel no mundo. É um processo sem fim, sempre dá para aprofundar mais. Estamos descobrindo e sempre vamos descobrir mais. Não queremos virar um negócio estanque, paradão.
Mas não imaginávamos que íamos precisar nos movimentar tanto, tão rapidamente.
Tivemos que adiar um sonho. Estávamos indo montar uma fábrica maior na Barra Funda e veio a pandemia. Não foi fácil. Mas recuar, redesenhar o plano, mostrou que somos capazes de nos adaptar. Em um nível que não sabíamos que éramos capazes. De novo aquele sentimento ambíguo: tristeza por abandonar um sonho e felicidade por conseguir se adaptar, sobreviver e crescer. Uma alegria envergonhada, contida pela cautela de quem começa a respeitar o imponderável.
Perdemos uma dose da ingenuidade que nos ajudou tanto lá no começo. Mas no lugar, ganhamos uma dose extra de otimismo.
O "modo sobrevivência" nos levou a encarar desafios inimagináveis. Pode ser que eles passem batido para quem bebe as nossas cervejas. Mas, do lado de cá, trazem uma dose extra de pressão.
Por exemplo: com o fechamento dos bares e restaurantes, passamos a envasar em lata todo o volume de nossa produção. Antes, parte da produção ia para envase em lata e parte para chope, para o nosso Taproom e também para parceiros. De repente 100% foi para lata. Uma mudança difícil para uma cervejaria com nosso porte. Aprendemos muito com esse teste prático de sobrecarga no envase. Caíram muitas fichas.
Fechamos o ano com a sensação de que o pior passou. Demos conta. Estamos prontos para novos passos. Chegamos à marca de 300 cervejas lançadas! Vamos tirar do papel novos projetos em 2022 e, enfim, inaugurar algumas novidades com adaptações diante dos aprendizados no período de pandemia. Encerramos 2021 recebendo novos investidores, gente que está apostando no nosso sonho. Para nós, é uma baita validação. Uma confirmação de que estamos sabendo ouvir o coração e a mente e navegar na direção certa, a ponto de outros passageiros quererem embarcar nessa viagem conosco.
Dani e Beto.
PS. Escolhemos o pôster da Nau para ilustrar essa retrospectiva porque ele representa exatamente o que sentimos nesses dois anos: encaramos uma onda atrás da outra, mas sempre em frente, com o norte claro de produzir as cervejas que a gente ama